Na busca por saciar nossa sede de narrativas originais e histórias verdadeiramente inventivas, enfim encontramos tudo isso a partir desta quinta-feira (17), com o mais novo longa da prolífica parceria entre o diretor Ryan Coogler e Michael B. Jordan. Este filme é diferente de tudo que vi em muito tempo: uma evolução do terror negro, que apresenta com maestria uma potente mensagem sobre racismo, o valor da ancestralidade e o sentido de pertencimento — tudo isso envolto em uma atmosfera de misticismo intoxicante.

No longa, Michael B. Jordan interpreta irmãos gêmeos que retornam à cidade natal com o objetivo de reconstruir a vida e apagar um passado conturbado. Esses acontecimentos, no entanto, voltam a atormentá-los quando uma força maligna passa a persegui-los, trazendo à tona medos e traumas profundos. Esse mal deseja dominar a cidade e todos os seus cidadãos, obrigando-os a lutar para sobreviver. Mais do que enfrentar demônios dominadores e famintos por poder (e sangue), Smoke e Stack (ambos vividos por Jordan) terão que lidar com lendas e mitos ameaçadores que podem estar por trás desse terror.

Coogler mais uma vez demonstra ser um dos maiores cineastas da atualidade. Ao longo de 2h17min, une temáticas distintas de forma poderosa e incessante, contando com um elenco de primeira linha, liderado por Jordan em uma performance dupla arrasadora. Fuligem e Fumaça coabitam um no outro com uma verdade que transcende a tela, tendo ao redor dessa relação um cenário de época cru e singular.
Criatividade inigualável
Sem nos poupar no brilhantismo e no sangue, a alegoria dos vampiros é diabolicamente divertida — uma verdadeira aula de cinema diante dos nossos olhos. É para sair da sessão completamente revigorado e ciente de que Pecadores será assunto por muitos anos, pois combina gêneros tão distintos de uma forma inédita. A direção de Coogler é um mergulho em sua própria e abençoada imaginação.

Como exemplo, em uma cena muito específica — talvez a melhor que vi em um filme desse porte —, é possível testemunhar o ápice da profundidade temática do longa: um momento em que os enredos coexistem com equilíbrio e justificam-se mutuamente. Tudo isso construído com camadas de dualidade e paixão que resultam em um filme completo, de corpo e alma.
Um filme de estúdio, mas com alma
Liberto de muitas das amarras que engessam a indústria, Coogler ascende ao próximo nível com um estilo próprio e singular. Ainda que possamos notar influências de Quentin Tarantino — sobretudo no uso vigoroso da violência e do sangue —, há aqui parâmetros mais elevados. A narrativa nos envolve mentalmente em uma jornada intensa e sangrenta.
É interessante notar como somos transportados para a era Jim Crow, em Clarksdale, Mississippi, onde a história se passa. Embora a primeira hora tenha um ritmo mais lento, nunca soa maçante. É um deleite visual explorar aquele lugar sob o olhar da diretora de fotografia Autumn Durald Arkapaw, que nos incendeia com composições ousadas e sombrias, traduzindo o intelecto por trás de cada quadro.

Mesmo com muita coisa acontecendo, as duas metades do filme — embora distintas — se fundem com força, criando algo que não pode ser confundido com qualquer outra produção. Ainda que Pecadores não reinvente a roda dos filmes de terror com vampiros, ele propõe um discurso novo, embalado por uma trilha sonora inventiva de Ludwig Göransson — uma verdadeira mixtape quente que reflete as experiências dos personagens.
Um elenco formidável
Profundamente enraizado nas vivências da população preta, o filme traz um terror cultural e social poderoso. O resultado disso não seria possível sem uma escalação de elenco digna de nota. Todos os atores sustentam a narrativa com maestria, a ponto de ser difícil destacar apenas um — cada um contribui para que os pilares do filme nunca soem forçados.

Mas os holofotes inevitavelmente recaem sobre Miles Caton, um novato de apenas 20 anos que se revela uma verdadeira estrela. Com uma voz marcante e presença magnética, ele rouba a cena como o primo do personagem de Jordan. Em sua atuação como Sammie, é possível enxergar a pureza de uma estrela em ascensão, da qual certamente ouviremos falar muito daqui em diante. Ainda assim, o conjunto do elenco demonstra que não é apenas a escolha individual que faz a diferença, mas a completude de um grupo afiado e coeso.
Um ritmo que exige entrega
Dito isso, talvez a única falha de Pecadores seja o ritmo — que, embora possa parecer longo demais em certos momentos, não compromete o impacto do desfecho nem o peso do elemento sobrenatural. Pelo contrário: quem se entrega ao tempo do filme é recompensado com um final à altura de toda sua construção simbólica e visceral.
Nota do crítico:

Título: Pecadores
Duração: 2h17min
Gênero: Ação, Terror, Suspense
Onde Assistir: Cinemas
Sinopse: Michael B. Jordan interpreta irmãos gêmeos que voltam à sua cidade natal com o objetivo de reconstruir a vida e apagar um passado conturbado. Esses acontecimentos, porém, voltam a atormentá-los quando uma força maligna passa a persegui-los, trazendo para a superfície medos e traumas. Esse mal busca tomar conta da cidade e de todos os cidadãos, obrigando-os a lutar para sobreviver. Mais do que contornar os demônios dominadores e famintos por poder (e sangue), Smoke e Stack (Michael B. Jordan) terão que lidar com as lendas e os mitos ameaçadores que podem estar por trás desse terror.